Por que trabalhar em grupos?

Segundo Vygotsky, um dos autores em que buscamos fundamentos para nossa proposta pedagógica, “’aprendizagem’ significa processo de ensino-aprendizagem, incluindo quem aprende, quem ensina e as relações sociais entre eles, numa perspectiva sócio-histórica. Assim, a aprendizagem consiste na internalização progressiva dos instrumentos mediadores e é uma aplicação do princípio de que todo o processo psicológico superior vai do âmbito externo para o interno, das interações sociais para as ações internas, psicológicas” (Castorina, José Antonio/1996).

Duas implicações importantes daí decorrem para o âmbito escolar: a importância da intervenção do professor e da interação entre pares.

Sobre a primeira, diz Marta Kohl de Oliveira (1996): “O indivíduo não tem instrumentos endógenos para percorrer, sozinho, o caminho do pleno desenvolvimento. O mero contato com objetos de conhecimento não garante a aprendizagem, assim como a simples imersão em ambientes informadores não promove, necessariamente, o desenvolvimento, balizado por metas culturalmente definidas. A intervenção deliberada dos membros mais maduros da cultura no aprendizado das crianças é essencial ao seu processo de desenvolvimento. (…) Na escola, portanto, onde o aprendizado é o próprio objetivo de um processo que pretende conduzir a um determinado tipo de desenvolvimento, a intervenção deliberada é um processo pedagógico privilegiado. Os procedimentos regulares que ocorrem na escola – demonstração, assistência, fornecimento de pistas, instruções – são fundamentais para a promoção de um ensino capaz de promover o desenvolvimento. A intervenção do professor tem, pois, um papel central na trajetória dos indivíduos que passam pela escola. O referencial vygotskiano nos aponta, assim, os processos pedagógicos como processos intencionais, deliberados, dirigidos à construção de seres psicológicos que são membros de uma cultura específica, cujo perfil, portanto, está balizado por parâmetros culturalmente definidos.”

E é nessa perspectiva que vemos a atuação do profº: como aquele que problematiza, informa, coordena, reorganiza e devolve as questões e formulações, apoia e sustenta a construção dos alunos e oportuniza a sistematização dos conhecimentos; além disso, organiza o ambiente de aprendizagem e as dinâmicas de trabalho, entre as quais está a configuração da própria sala de aula, que não é casual, mas também intencional, devendo estar relacionada aos objetivos da proposta.

Em relação à segunda implicação, importância da interação entre pares, é Delia Lerner quem nos traz, a partir de uma vasta experiência didática, baseada na teoria psicogenética de construção do conhecimento e relativa à Língua Escrita e à Matemática, seja como pesquisadora ou como coordenadora da Direção de Currículo da cidade de Buenos Aires: “…postula-se como princípio pedagógico fundamental ‘propiciar permanentemente a cooperação entre as crianças, dado que a confrontação entre distintas hipóteses e conhecimentos específicos desempenha um papel preponderante no desenvolvimento do processo’ e salienta-se a fecundidade dos intercâmbios produzidos entre os alunos, sobretudo quando trabalham em pequenos grupos.” Segundo esta autora, o próprio Piaget (1969) afirmava que “a cooperação entre as crianças é tão importante para o progresso do conhecimento como a ação dos adultos e que as situações de discussão entre pares, por permitir um verdadeiro intercâmbio de pontos de vista, são insubstituíveis como meio de incentivar a formação do espírito crítico e de um pensamento cada vez mais objetivo.” E continua citando-o, dizendo que estas mesmas razões levam-no a afirmar em outra obra (1974): “Portanto, se tivéssemos que escolher entre o conjunto de sistemas pedagógicos atuais aqueles que correspondessem melhor aos nossos resultados psicológicos, tentaríamos orientar o nosso método àquilo que foi denominado ‘o trabalho em grupo’ (…) Na escola tradicional, (…) a classe escuta em conjunto, porém cada escolar escuta suas lições para si mesmo. Esse procedimento (…) é contrário às exigências mais claras do desenvolvimento intelectual e moral. O método de trabalho em grupo reage contra esse estado de coisas: a cooperação eleva-se à categoria de fator essencial do progresso intelectual.”

Pois bem, acreditando nesses princípios, que dizem que para aprender os alunos têm de estar em contato uns com os outros, confrontando ideias e reestruturando sucessivamente suas próprias hipóteses, e que o trabalho em grupos favorece a circulação de informações que enriquecem as experiências das crianças, organizamos as salas de aula na escola geralmente em pequenos grupos de 3, 4 ou 5 elementos, propondo trabalhos que sejam realizados em conjunto ou que suponham as trocas entre os alunos mais próximos. Em grupo as crianças podem observar diferentes formas de pensar, registrar, interagir. Contrapõem hipóteses e têm a possibilidade de testar ou refutar ideias, vivenciando o chamado ‘conflito sócio-cognitivo’, que é muito fecundo para o progresso do conhecimento, mas não só em relação à interação do sujeito com outros que estejam mais adiante ou possuam conhecimentos mais amplos sobre a questão que estão tentando aprender. Esses conflitos são muito produtivos para o avanço cognitivo porque facilitam a tomada de consciência da criança sobre as respostas diferentes da sua, obrigando-a a descentrar-se da sua resposta inicial, porque a resposta diferente do colega é portadora de informação e atrai a atenção do sujeito para outros aspectos pertinentes da tarefa que ela não tinha considerado e porque a necessidade de chegar a um acordo incita a incrementar a atividade intelectual. Mais adiante, falaremos de modos de formação dos grupos e das intervenções do professor para que estes conflitos sejam realmente produtivos.

Uma outra razão importante para se propor trabalhos em grupos é que eles oportunizam o aprendizado da produção em conjunto, que, por sua vez, promove o desenvolvimento de uma série de capacidades relacionadas à cooperação e ao desenvolvimento sócio-moral, como ouvir o outro e levar sua ideia em consideração, respeitar o outro, mesmo que ele pense diferente, saber negociar, levando em conta diferentes ideias para produzir algo que seja do coletivo. Segundo Rheta De Vries e Betty Zan (1998), “A necessidade que a criança tem de estar ativa inclui uma necessidade para ser interativa. O professor construtivista promove a interação com colegas organizando o programa de modo que o engajamento interpessoal ocorra naturalmente.” Como as autoras, acreditamos que um ambiente sócio-moral, no qual o respeito por outros é continuamente praticado, deve ser cultivado pela educação escolar, já que “todas as interações entre as crianças e entre elas e seus educadores/responsáveis têm um impacto sobre a experiência e desenvolvimento social e moral das crianças.” Ou seja, pensamos que somente dizer que a interação é benéfica para a socialização não basta.

É preciso que a escola e o professor se organizem para oferecer experiências favoráveis à competência social e ao desenvolvimento moral, encorajando as interações, permitindo que os conflitos venham à tona, e até explicitando-os e trazendo-os para discussão na turma, encorajando os intercâmbios e ajudas entre as crianças, auxiliando-as e mediando quando necessário, engajando-se ocasionalmente como companheiro das crianças e facilitando a interação quando a auto-regulagem dos alunos fracassa, selecionando e organizando a mobília da sala e o planejamento das atividades para que provoquem a interação, otimizando, assim, o caráter interativo da sala de aula, numa autêntica experiência de conviver.

Dentre essas formas de organização estão, sem dúvida, os pequenos grupos, as rodas de produção coletiva e as duplas de trabalho. Sem descartar a importância do engajamento do professor nessas interações com as crianças, as autoras salientam que “As relações com companheiros são especialmente facilitadoras do desenvolvimento social, moral e intelectual por duas razões. A primeira é que as relações com companheiros caracterizam-se por uma igualdade que jamais pode ser alcançada nas relações adulto-criança, não importando o quanto o adulto tente minimizar a heteronomia. As relações com companheiros podem levar ao reconhecimento da reciprocidade implícita nas relações de igualdade. Esta reciprocidade pode proporcionar a base psicológica para o descentramento e adoção de perspectiva. Uma vez que a autonomia pode ocorrer apenas em um relacionamento de igualdade, as crianças são mais capazes de pensar e agir de forma autônoma com outras crianças do que com a maior parte dos adultos. (…) A segunda razão pela qual as relações entre colegas oferecem um bom contexto para o desenvolvimento é que ver outras crianças como semelhantes a si mesmo resulta em um sentimento especial de interesse que motiva os contatos entre companheiros. Esses contatos são esforços sociais, morais e intelectuais. No curso da interação com colegas, as crianças constroem a consciência e a diferenciação de si mesmas e dos outros, esquemas de reação social e cooperação no pensamento e na ação.”

É fundamental que a criança tenha oportunidade de exercitar o repartir, tendo contato com a diferença, com a qual tem de aprender a lidar, e percebendo a contribuição de cada indivíduo no pequeno grupo, assim como deste no grande grupo e vice-versa. E é nos trabalhos em grupo que os alunos podem desenvolver atitudes de cooperação nas quais os pontos de vista são equacionados no sentido de uma produção coletiva e do interesse comum. Não há a prevalência do ponto de vista individual, mas sim daquele que define as ações responsáveis pelo bom andamento do trabalho. Isso porque as tarefas, no trabalho em grupo, estão divididas entre todos os membros, assim como a responsabilidade por realizá-las a contento. As informações, trocas e interações acontecem em função da produção dessas tarefas, de modo que todos os participantes atuem, opinem e realizem aprendizagens significativas.

Como formamos grupos?

Para que os grupos possam cumprir os papéis descritos anteriormente, atingindo os objetivos de multiplicar as interações entre os alunos, o que potencializa suas possibilidades de aprendizagem, de oportunizar o desenvolvimento da capacidade de descentrar-se e conhecer diferentes pontos de vista, de reformular as suas próprias ideias, agregando novas ao que pensava individualmente ou formulando uma ideia que seja do grupo, com cada membro colaborando conforme suas possibilidades, é preciso que a forma de organizá-los seja muito bem pensada, pois nem sempre trabalho em grupo é sinônimo de construção social do conhecimento. Aliás, é comum que alguém assuma o papel da liderança e os demais se subordinem às suas propostas, copiando ou imitando sem convicção, ou que alguém permaneça à margem da interação ou se limite a apoiar o que os outros fazem.

Então, quais seriam as condições que favorecem uma interação produtiva nos subgrupos? Segundo Delia Lerner, algumas dessas condições seriam:

  • Os grupos devem ser pequenos para que a responsabilidade não se dilua, para que cada membro sinta-se muito comprometido com o trabalho; o agrupamento em pares (duplas) seria, assim, bastante indicado;
  • Conceder um tempo para que as crianças pensem individualmente no problema colocado antes de intercambiar com os colegas, favorece que todas (e não apenas algumas) tenham algo para contribuir com a discussão;
  • Os intercâmbios mais enriquecedores, quando as crianças estão se apropriando do sistema de escrita, ocorrem entre sujeitos que estão em níveis diferentes, porém próximos do processo construtivo em questão, mas isto não pode ser generalizado para outras etapas da própria escrita ou da leitura, por falta de estudos; genericamente, o que se pode dizer é que é preciso haver entre os sujeitos, para que as interações sejam mais fecundas, suficientes conhecimentos em comum para se entenderem e suficientes discrepâncias ou diferenças para poderem comparar suas ideias e enriquecerem-se mutuamente;
  • É conveniente que cada criança tenha a oportunidade de interagir com muitas outras e que os subgrupos, em vez de ficarem constituídos desde o primeiro dia para todo o ano escolar, sejam variáveis e essa variação permita determinar quais são as crianças que estão em condições de cooperar melhor em cada período e para cada atividade.

A esses itens acrescentaríamos:

  • Explicitar sempre as questões das crianças, os desejos e conflitos que permeiam as relações entre elas (antes, durante e depois das formações dos grupos), permite que se possa conversar, dialogar, buscar soluções e, portanto, que as crianças avancem nas suas formas de se relacionar, socializando-se gradativamente e na perspectiva da cooperação;
  • Se a profª atua para assegurar que não há criança que não aprenda, oportunizando espaços para que apareçam as diferentes habilidades, conhecimentos, formas de pensar e agir, e os diferentes talentos de cada criança, valorizando-os, apoiando-os e aproveitando-os para o enriquecimento da produção do grupo, é mais provável que possa reverter tendências ou resistências, provocar reformulações de posturas (dinamicidade na troca de papéis, ou seja, mobilidade de posições) e contribuir com a construção do sujeito.

Um formato que encontramos para satisfazer essas condições foi o dos GRUPOS ÁULICOS (*), que passamos a descrever, em termos de procedimentos, vantagens e cuidados.

(*) Nomenclatura utilizada pelo Geempa (Grupo de Estudos sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação) desde os anos 70 e explicada como uma organização de grupos em que entra o desejo dos alunos, com diretividade. O Geempa começou, nos anos 70, como Grupo de Estudos sobre o Ensino da Matemática; tem a profª Esther Grossi como sua principal representante e articuladora.

Como funcionam os grupos áulicos?

Depois de um breve e necessário período de (re)aproximação e (re)conhecimento mútuo entre os alunos de uma turma (início do ano letivo), a proposta é de que eles escolham e votem, de forma secreta, em alguém com quem gostariam de trabalhar/estudar por algum tempo (brincar ou jogar, no caso da EF). Também pode ser proposto que votem em um coordenador/chefe que preferem para o seu grupo. Nas turmas em que há muitos alunos novos, deve-se esperar um pouco mais de tempo para que se conheçam, enquanto se faz formações mais aleatórias ou livres.

Outro procedimento possível é o do voto triplo, em que propomos que cada aluno vote em 3 colegas:

1. aquele com quem gostaria de aprender algo;

2. aquele com quem mais se identifica;

3. aquele para o qual acha que pode e/ou gostaria de ensinar algo.

Neste caso, a cada votação recebida o aluno ganha um determinado número de pontos: se foi votado no 1º caso, ganha 3 pontos, no 2º, 2 pontos, e no 3º, 1 ponto.

É importante definir, conversando antes com a turma, sobre o tipo de trabalho que será desenvolvido nesse grupo que formarão e quanto tempo ele irá durar (em geral 1 mês e meio/metade do trimestre), assim como pensar em conjunto alguns critérios, auxiliando as crianças a definirem ou caracterizarem o(s) perfil(s) dos colegas em quem votar.

De qualquer modo, depois, durante o trabalho dos grupos, o profº terá de retomar a função de cada membro do grupo (não somente do coordenador!), a partir das situações e necessidades que forem vivenciando no trabalho em conjunto.

As crianças mais votadas, ou no caso do voto triplo as que obtiverem mais pontos (tantas conforme o n° de grupos que se quiser formar), são os primeiros componentes de cada grupo (ou os escolhedores), que passam a escolher colegas para fazerem parte do seu grupo. Se houver empate entre essas pessoas mais votadas, desempata-se através de voto aberto.

O ideal é que se formem grupos de 4 alunos, só havendo grupos de 3 ou 5 membros nas situações em que o nº de alunos da sala assim determinar.

Cada um dos “escolhedores” fica num lugar da sala, sendo a ordem do convite relacionada ao n° de votos: o mais votado escolhe primeiro, o 2º mais votado, em 2° lugar, e assim por diante. Na segunda rodada de escolhas, pode-se inverter a ordem, começando pelo menos votado. A partir da 2ª rodada as escolhas são realizadas em conjunto, devendo o aluno votado e o 1º escolhido entrarem num acordo sobre o terceiro colega a ser convidado, e assim por diante. O importante é que as crianças discutam entre si e cheguem a um consenso sobre quem querem convidar. O convite deve ser justificado: “Gostaríamos de convidar o fulano, porque…..”.

Do mesmo modo a criança convidada deve dizer se aceita ou não o convite, justificando a sua resposta, em qualquer dos casos. Deve ficar muito claro para a criança que não aceita participar de nenhum dos grupos que ela não poderá ficar sozinha, assim como para os grupos, caso resistam a aceitar alguma criança, que criança alguma pode ficar sem grupo.

Para os alunos que ficam por último, se pode propor o inverso, que eles escolham o grupo do qual querem fazer parte, grupo este que também tem a possibilidade de aceitar ou não, justificando sua posição. Quando houver alguma situação de impasse em relação a alguma criança, propor que se faça uma experiência, que se lhe dê uma chance, promovendo tratos e combinados, retomando com o pequeno grupo e com o próprio aluno, além de com a turma.
Formados os grupos, cada um deles se organiza num conjunto de classes, realizando a sua primeira produção, que será a escolha de um nome para o grupo e a formulação de regras que irão valer para eles, o que colocarão em um pequeno cartaz para afixar na sala. A professora deve discutir critérios e tópicos para esse trabalho, dentro daquilo que ela observa que deve ser mais trabalhado e cuidado pela turma: vai circulando e questionando cada grupo, auxiliando, retomando, orientando etc., para que essa produção seja de fato eficaz nos momentos de avaliação posteriores.

Cada grupo pode apresentar o seu trabalho à turma, permitindo que uns se enriqueçam com o trabalho dos outros; após a apresentação, todos podem reformular e incrementar o seu trabalho, se for o caso.

Também pode ser incluído aqui um trabalho específico com a questão da coordenação do grupo, retomando e discutindo suas funções. Alguns formatos de coordenação (coordenação mais duradoura, coordenação circular ou coordenação múltipla) têm sido experimentados nas diferentes turmas da escola, tendo em vista possibilidades e necessidades de cada uma e a trajetória dos professores em relação a esse tipo de trabalho. Esse é um aspecto, no entanto, a ser ainda incrementado no desenvolvimento da proposta.

A partir daí, os compromissos assumidos têm de ser cobrados e trabalhados periodicamente, através situações de avaliação com os pequenos grupos, para que as próprias crianças tenham oportunidade de se expressar sobre como estão se sentindo naquele agrupamento, como estão vendo a produção de cada um e do grupo, dando-se conta do que podem melhorar e de como podem encaminhar situações que não estão bem.

Essa avaliação é feita de diferentes maneiras: oralmente, com o subgrupo sozinho e/ou na turma toda; com fichas de avaliação por grupo e por escrito, baseada nos critérios levantados no início do trabalho, a partir ou não de conversa com a professora; o importante aqui é dar voz às crianças e refletir com muito cuidado sobre o que fazer com isso.

Por que os grupos áulicos são considerados pela escola como uma forma tão especial de formação de subgrupos? Quais as vantagens dessa formação em relação a outros tipos de agrupamentos?

São várias as razões e vantagens. Entre elas, podemos citar:

1) As crianças são chamadas a exercerem seu desejo e discernimento, bem como a assumir suas consequências – o processo de escolha “obriga” as crianças a chegarem a um consenso, submetendo-se frente à intersubjetividade e, portanto, se descentrando e se socializando. Fica claro, assim, que todas ficam comprometidas com as decisões, já que dela fizeram parte. Quando surgem conflitos, a professora tem condições e isenção suficientes para ajudar as crianças a se expressarem e dialogarem entre si, chegando conjuntamente a uma solução; pelo comprometimento assumido, o empenho das crianças nas atividades é maior e pode ser cobrado no grupo o desinteresse de um dos seus membros.

2) As questões do grupo são explicitadas e podem ser trabalhadas, sendo esse tipo de formação de grupos imensamente importante para uma turma de alunos, porque evidencia o que antes estava apenas subjacente às relações entre eles. Essa explicitação que acontece traz ao nível do consciente os sentimentos presentes na dinâmica que rege o relacionamento na sala, sendo esses sentimentos o pano de fundo das lideranças e rejeições. Se não os explicitamos, temos a ilusão de que eles não são uma fonte de sofrimento ou alegria, para rejeitados ou líderes. Sobretudo num grupo humano como uma turma de alunos, cujo objetivo comum é a aprendizagem, o olhar de uns sobre os outros é desencadeador ou não de aprendizagens.

Segundo Esther Grossi, “‘Todo desejo é desejo do outro’ e ‘todo conhecimento é conhecimento do outro’, na medida em que da solicitação do “olhar” do outro nasce o desejo, e na medida em que do direcionamento do mundo cultural que nos cerca é que se encaminha a construção dos conhecimentos. Portanto, o desejo de aprender é sustentado pelo contexto em que está o sujeito, e é nesse sentido que a estruturação dos pequenos grupos pode ser um auxílio à aprendizagem.”

3) Pelo tempo maior em que permanecem juntas e pelas dinâmicas de trabalho e de avaliação periódica, bem como pelas intervenções dos professores no sentido de contribuírem para os avanços buscados serem alcançados, oportuniza-se um espaço claro de reformulação de comportamentos e posturas das crianças, que provoca crescimento emocional e construção da moralidade, porque apela para o comprometimento e a cooperação de cada criança em relação ao seu grupo e dos grupos e turma em relação a cada criança.

4) Assegura-se um empenho maior de cada criança na atividade em si realizada, já que a sua participação é muito direta e ativa no processo.

5) Esse trabalho é uma lição eloquente de Estudos Sociais: politicamente, esta estruturação dos pequenos grupos tem bases sólidas: vive-se a expressão do desejo através do voto, foge-se ao arbítrio e se vivenciam princípios democráticos, como a descentralização do poder decisório (a escolha não é feita só pelo líder ou colega mais votado, sendo compartilhada com os outros membros do grupo) e a necessidade de sustentação e respeito pela organização que foi encaminhada social e cooperativamente, de forma a buscar o melhor para todos. Quer dizer, os grupos formados terão de construir uma convivência possível e produtiva, estando todos comprometidos com isso, a ponto de não poderem ficar trocando de grupo ou denegrindo a expressão organizada dos desejos de todos. Esperar até a próxima eleição para efetuar novas trocas significa educar para a democracia.

Quais os cuidados necessários?

É preciso ter claro que estamos trabalhando com uma eleição em que as pessoas escolhem e são escolhidas em público, portanto com uma situação delicada. Fundamentalmente, é a IMAGEM que temos uns dos outros que está em jogo e sobre ela podemos nos enganar, acreditando em potenciais que a criança não tem ou não apostando em crianças que de fato têm potenciais que não acreditávamos que teriam.

Por isso, é muito importante que a professora coordene esse trabalho de modo que a turma se sinta responsável pelo processo como um todo, construindo, aos poucos, a ideia de que todas e cada uma das crianças pertencem à turma, dela fazem parte e nela ou por ela têm de ser acolhidas da melhor forma possível para todos os envolvidos.

Pode ser necessário encaminhar algumas situações de modo excepcional: por exemplo, um grupo de 5 pessoas e outro de 3, em casos especiais.

No caso dos alunos que ficam por último, sempre nos é colocada uma questão: “Isso não é traumático ou prejudicial para elas?” Acreditamos, como Jaime Betts, que o mais prejudicial seria a ambiguidade de haver uma questão com algum aluno e esta ser escamoteada ou não explicitada, não permitindo que se possa dialogar sobre ela com clareza e dar a chance de reformular-se; se escondemos da criança sua real condição, seu estatuto frente ao grupo, evitando que ela sinta como é vista pelos demais, contribuímos para mergulhá-la na confusão. É preciso que sejamos capazes, como educadores, de nos comprometermos e de ajudar as crianças a expressarem e organizarem seus desejos relacionais, desde que (ou até para que), como pessoas, aprendam a ter clareza sobre seus sentimentos e o façam com respeito aos outros.

Também acreditamos, por outro lado, que os professores e coordenadores responsáveis por esse trabalho devem estar preparados para intervir adequadamente. Assim, além de permitirem que os últimos alunos escolham o grupo do qual querem fazer parte, invertendo a relação, a equipe deve ter muito claro que essa situação não deve ficar se repetindo com uma mesma criança, pois se isso acontecer é sinal de que estão faltando intervenções adequadas. Pais e professores devem ficar atentos para que a criança possa ser auxiliada a sair de posições desconfortáveis no grupo.

Entre outras, algumas das intervenções necessárias para esse tipo de situação não se repetir seriam:
1) Realizar o contrato com ambas as partes: com a própria criança e com o grupo que a escolheu ou acolheu, trabalhando a partir desse contrato e dando continuidade a ele, para conseguirem mantê-lo; nesse sentido, é imprescindível que o profº esteja muito atento ao grupo e ao aluno, para que os combinados deem certo; deve dar-lhes o apoio e o auxílio necessários para que a criança em questão seja melhor sucedida do que no seu grupo anterior, por exemplo, de modo a oportunizar que saia daquele lugar de “a última escolhida”, a que nunca é votada etc.;
2) Intervenções de reconhecimento, colocando ao grupo uma visão positiva do aluno, valorizando suas ações e produções, sempre que possível, fazendo “estardalhaços” que mostrem sua alegria pelas conquistas do aluno, mesmo que pequenas, o que contagia e motiva o grupo todo, estabelecendo uma reação em cadeia, em que cada elogio é adubo para mais esforço e busca de melhoria; isso ajuda, com certeza, depois, a que a criança esteja em outra posição na formação de novos grupos;
3) Trabalhar com o papel ou função de cada membro do grupo, ou seja, de todos, e não só do líder ou coordenador.

Esses três aspectos bem trabalhados garantem a alternância do lugar de cada um, sem que seja necessário modificar os critérios citados acima ou sua pontuação, o que não seria adequado, pois é uma forma “artificial” de tentar resolver a situação, ou seja, não trabalha com a questão em si, mas apenas com seus resultados.

Também as crianças com necessidades especiais ou aquelas com determinadas características de comportamento ou de postura em relação ao trabalho consideradas não muito adequadas ou cooperativas podem não aparecer no início das escolhas e terão de ser incluídas! Assim, como já dissemos anteriormente, é fundamental que a professora assegure a toda a turma que não há aluno que não aprenda, desbloqueando os que se sentirem assim e demonstrando com fatos concretos que há nisto um engano.

Quanto mais estivermos atentos a esse tipo de questão delicada, que pode surgir, melhor atuaremos para:
– Reorganizar e devolver ao grupo os encaminhamentos pensados;
– Convocar o grupo para a reflexão e discussão, em que sejam confrontados os diferentes pontos de vista;
– Auxiliar na explicitação e/ou formulação da questão, tanto no que diz respeito à recusa de um convite, por exemplo, e às crianças que “ficam por último” nas escolhas, como em relação às crianças que são as primeiras escolhidas e nunca conseguem formar um grupo juntas.

São adotadas outras formas de organização da turma na escola?

Sim, a partir de diferentes autores, que temos estudado, e da nossa prática reflexiva na escola com uma proposta que busca se aproximar cada vez mais ao que se chama hoje de construtivismo, o que supõe que “aprende-se em interação com os demais” e “resolvendo problemas”, temos praticado as seguintes formas de configuração e formação:

Trabalho em grande grupo – Vários trabalhos são realizados nessa modalidade, em que os alunos estão organizados em roda, em “U” ou num “quadrado” (quando com as classes juntas, em geral no ensino fundamental); na educação infantil, quando é mais importante incentivar as relações e construções coletivas, auxiliando-os a se descentrarem, gradativamente, são realizadas rodas de história, de planejamentos e combinações, produções coletivas de artes, entre outras atividades. No ensino fundamental são realizados nesse formato seminários de leituras, levantamento de hipóteses a partir de problematizações em diferentes áreas do conhecimento, inclusive de questões sócio-afetivas, que envolvem a turma (como as Assembleias de Classe), apresentação e discussão das diferentes formas de resolução para problemas matemáticos, encontradas nos pequenos grupos, formulações coletivas, combinações e planejamentos conjuntos sobre os trabalhos, jogos etc.; essa modalidade também é utilizada na Educação Física, na Música, no Teatro e no Inglês;

Trabalho individual – Na educação infantil não é possível e no ensino fundamental é raro as classes estarem com a configuração de fileiras, propondo que não haja contato entre os alunos, mas acontece em momentos que a professora precisa garantir uma produção individual, seja para uma avaliação, em que quer/precisa observar como está a produção do aluno nessa situação individual, sem ajuda ou troca, seja para preparar alguma participação na dupla, pequeno grupo ou no grande grupo; é quando propomos uma problematização que leve cada aluno a se conectar com seus próprios conhecimentos anteriores e com sua capacidade de formulá-los, tendo um espaço de organização das suas ideias para garantir uma participação mais ativa no momento posterior, evitando, assim, que somente poucas crianças (em geral, sempre as mesmas, mais falantes e desenvoltas) se coloquem e tenham oportunidade de aprender; também individualmente se realizam leituras, resolução de problemas matemáticos, produções de artes plásticas, produções de textos, correção de textos etc.;

Duplas – Conforme o objetivo do trabalho, os pares são mais ou menos heterogêneos, podendo ser diferentes ou não em relação ao pequeno grupo já formado (às vezes, aproveitamos o grupo áulico já formado, e dali saem as duplas); assim como nas propostas individuais, essa modalidade é muito usada para preparar uma discussão no grande grupo ou uma determinada participação no pequeno grupo; após um momento de reflexão e formulação individual, os alunos fazem uma confrontação dessas ideias com um colega, reformulando na dupla suas hipóteses iniciais, ampliando-as e enriquecendo-as, para depois ir ao coletivo ou ao pequeno grupo; normalmente, a professora escolhe e organiza as duplas, mas as crianças também podem participar e propor alternativas; essa modalidade também é utilizada em situações de “tutoria”, quando alunos mais avançados em algum conteúdo são colocados para ajudar aqueles que ainda têm alguma defasagem; muitas vezes, os alunos se organizam espontaneamente em duplas ao terminarem algum trabalho e verem que outros colegas ainda não o fizeram, oferecendo-se para ajudar quem precisa; são realizados em duplas jogos, elaborações e revisões de textos (um revisa o do outro e trocam), conferências de tarefas de casa, registros de estudos e produção de histórias e poemas; trabalho no computador; produção oral na aula de inglês (entrevistas, praticando perguntas e respostas) e até leituras;

Pequenos grupos, preferencialmente de 4 crianças – É como normalmente os alunos ficam dispostos em sala e como vezes trabalham na maior parte do tempo; o procedimento de formação é o dos chamados “grupos áulicos” (já descrito anteriormente), realizado em geral a cada dois meses, ou um mês e meio, com a participação ativa dos alunos; nessa modalidade se realizam também os trabalhos da aula de Teatro, Inglês, Música e Educação Física, jogos na sala, produções textuais ou de artes plásticas, formulações a partir de discussões no grande grupo, resolução ou elaboração de problemas ou desafios matemáticos, ou de qualquer outra área, as quais são apresentadas ao grande grupo posteriormente, correções de tarefas de casa etc.; esse é um trabalho que costumamos começar no 1º ano; antes, com os pequenos do infantil, é interessante observar como interagem em diferentes formações de grupos (espontâneas, formadas pela professora etc.) e incentivar as relações e construções coletivas;

Grupos formados pela metade da turma – Essa modalidade é utilizada nas áreas de Teatro e Inglês, quando a turma tem de ser dividida para o trabalho. Em geral são formados pelas professoras em conjunto com as crianças, utilizando procedimentos de formação dos grupos áulicos, levando em conta alguns critérios, como a necessidade de contemplar aproximações ou separações, ampliação de relações ou os conteúdos e objetivos da atividade;

Trabalhos entre turmas – Algumas situações, ao longo do ano, oportunizam essa organização do trabalho, quando as turmas (2 ou 3 de cada vez) se juntam e se integram em alguma produção, através de apresentações de trabalhos, umas para as outras, os quais resultaram de estudos que cada turma realizou durante um determinado período: diários de viagens ou seminários de leituras, em que os alunos apresentam a um público maior que o da sua sala o livro que leu ou a viagem que fez; palestras ou entrevistas com convidados; festas; leituras em duplas, sendo um aluno de cada turma; encontros dos G4 com os 1ºs anos etc.; essa modalidade também é utilizada na Educação Física (campeonatos) e no Teatro (mostra de teatro anual).

No 1º ano temos procurado nos aproximar da técnica dos grupos áulicos, mas com algumas adaptações, no 1º trimestre, com o objetivo de que vivenciem as escolhas (escolher e ser escolhido) e comecem a perceber as funções do coordenador em relação aos demais membros do grupo e às atividades a serem realizadas: auxiliar os colegas nas tarefas difíceis, ajudar a resolver conflitos, organizar o grupo na hora de guardar jogos e brinquedos, não brigar e não empurrar, ser solidário com todos. Também utilizamos outras modalidades de formação nessa etapa, procurando garantir mais trocas e variações. O período de duração dos grupos também é mais curto que o dos grupos áulicos, que iniciam no 2º semestre.

A escolha do coordenador e, depois, dos membros dos grupos, nessa etapa inicial, acontecem de diferentes maneiras, como:
• Sorteio do coordenador pelas fichas da chamada e, cada um, é responsável pela escolha dos componentes de seu grupo. A professora indica quem deve escolher a cada vez, observando que o último coordenador que escolheu um colega na primeira rodada, deve iniciar a segunda rodada escolhendo.
• Sorteio dos coordenadores de cada grupo e, posteriormente, sorteio de cada criança que poderá escolher a qual grupo irá participar. Dessa forma não são os coordenadores que escolhem e, sim, cada criança.
• Dinâmicas ou brincadeiras, através das quais se obtém escolhas aleatórias. Como, por exemplo, a dos pacotes: ao som da música todos devem dançar e. quando a música para, a professora indica uma quantidade de crianças que devem agrupar-se para formar “pacotes” (grupos de crianças de braços dados). Esses pacotes vão se alternando até formarem 5 grupos (quantidade de mesas da nossa sala).
• A professora organiza os grupos de acordo com os objetivos que ela tem para as diferentes atividades, organizando-os de forma mais heterogênea para o desenvolvimento de atividades que fiquem enriquecidas com a diversidade de hipóteses; e, de forma mais homogênea, quando as propostas necessitem um nível de produção mais parecido entre os alunos.

Nos grupos dos alunos menores da educação infantil (Grupos 1, 2, 3, 4 e 5), além das situações de jogo ou brinquedo, em que as crianças interagem umas com as outras, propomos periodicamente situações em que os alunos tenham que produzir coletivamente ou em pequenos grupos, realizando trabalhos em que tenham de se organizar para todos participarem e contribuírem de algum modo.

Pensando apenas nos pequenos grupos, podemos contrapor aos chamados Grupos Áulicos, para nós a situação ideal de formação de grupos, outras situações (como fez Jaime Alberto Betts/2005) que, se não favorecem as melhores interações possíveis, também não precisam ser descartadas a priori, já que em determinadas condições podem resultar adequadas. Vejamos como a escola lida com essas outras formas, o que pensa sobre elas e como as utiliza:

Grupos determinados pelo professor – Nessa alternativa o único desejo expresso é o do profº e as crianças a eles devem se submeter mais ou menos passivamente; isso empobrece a interação afetiva e cognitiva entre os componentes do grupo, já que não contaria com o compromisso do desejo das crianças; toda a riqueza da representação e expressão do desejo das crianças, que envolveria um diálogo e um trabalho para superação de indiferenças e rejeições, visando a socialização, ficaria descartada nesse formato. Mas, às vezes, o utilizamos, pois nos parece oportuno para provocar ou oportunizar aproximações ou ampliação de relações de determinadas crianças entre si, conforme objetivos relacionais ou de aprendizagem cognitiva mesmo; pensamos que conforme a consciência e clareza do profº sobre as “desvantagens” deste formato, ele poderá utilizá-lo de forma mesclada, quer dizer, abrindo um espaço de negociação, conversa e explicitação dos objetivos da formação, trazendo maior sentido a ela;

Formação de grupos espontâneos (sem diretividade do profº) – Essa situação é interessante e produtiva, em um primeiro momento, para oportunizar um conhecimento mútuo, inicial, entre as crianças; mas, para uma utilização mais permanente, acreditamos haver maneiras mais adequadas para grupos de crianças, já que nesta dificilmente explicitariam os motivos de suas escolhas ou rejeições, a não ser com o auxílio do adulto; também acreditamos que o gesto de reunir-se está sujeito a reações esporádicas de aceitação ou rejeição, não se prevendo uma operacionalização desses manejos e talvez mesmo fazendo-nos pensar se “vale à pena” interferir, já que são tão efêmeras; esse tipo de formação é mais utilizado na educação infantil, em diferentes momentos da rotina (pátio, lanche, brinquedo na sala e até mesmo algumas produções); no ensino fundamental é utilizado durante o período anterior à formação dos grupos áulicos, observando como se operam essas escolhas sem intervenções;

Formação de grupos por sorteio (decisão aleatória) – Em algumas situações, pode ser útil, como na situação explicada acima, se queremos assegurar a experiência de contato com um grande nº de colegas, no início do ano para irem se conhecendo; mas é importante deixar claro o objetivo ao se usar esse outro tipo de formação, tão aleatório;

Formação de grupos a partir de levantamento sociométrico – Essa alternativa leva em consideração os desejos das crianças, mas perde a oportunidade de que elas mesmas os expressem mutuamente.

Acreditamos que a variação das dinâmicas favorece o atendimento a diferentes necessidades e formas de aprender dos alunos e aos diferentes objetivos dos trabalhos, além de ser algo interessante para as crianças vivenciarem diferentes formas de organização de grupos, podendo compará-las entre si e avaliá-las. Do mesmo modo, garante que o professor possa perceber a trajetória de seus alunos, como um grupo, e de cada aluno individualmente, diagnosticando o nível de desenvolvimento que já alcançaram, ou não, em relação a determinado conteúdo para intervir adequadamente.

Como trabalhamos para contemplar as diferenças individuais e o coletivo?

O número reduzido de alunos por turma permite uma aproximação entre professores e alunos e com as famílias. As intervenções podem ser individualizadas e personalizadas, tanto nas atividades de aula, como no encaminhamento das tarefas de casa.

Já aprendemos que não há alguns alunos diferentes, mas que somos todos diferentes, ou seja, que nas nossas salas de aula cada aluno é diferente do outro. Isso implica em que aceitemos e saibamos administrar o fato de que aquilo que “ensinamos” não é “aprendido” da mesma maneira, no mesmo tempo, por todos. Quer dizer: teremos de estar atentos a cada aluno, procurando oportunizar propostas e intervenções diversificadas, contemplando os diferentes níveis, em relação a diferentes conteúdos/áreas de conhecimento, em que estiverem. Uma das formas como procuramos viabilizar isso, na prática, é através do chamado “trabalho diversificado em pequenos grupos”, em que apresentamos diferentes propostas simultaneamente, de modo que cada um vá desenvolvendo-o no seu tempo e a partir do seu nível, com o professor intervindo de forma mais direta e próxima com cada aluno.

Essa perspectiva se estende às tarefas de casa, quando alunos recebem lições diferentes, em função de necessidades e possibilidades diferentes. Da mesma forma, as “tarefas extras” vêm ao encontro de necessidades de sistematização que alguns alunos possam ter a respeito de determinados conteúdos (da escrita, da leitura ou da matemática). Essas tarefas são semanais, como módulos de trabalho, que vão sendo cumpridos, gradativamente, até o aluno mostrar a evolução desejada naquele aspecto. Em qualquer dos casos, o acompanhamento da família é essencial e solicitado.

Numa outra instância, mas com objetivos semelhantes, temos os chamados “Grupos de Apoio”, que são outra forma de atender alunos que apresentem alguma necessidade mais específica de aprendizagem ao longo do ano. Formados em três épocas do ano (abril, agosto e novembro), os grupos (de 5 ou 6 alunos, reunidos por ano escolar e foco de trabalho a ser realizado) funcionam no turno oposto, com encontros semanais de 1 hora e meia (6 encontros, em geral), coordenados por uma professora, que, em contato com a professora do aluno e com a coordenação, planeja e realiza atividades especiais para cada aluno, conforme as suas necessidades mais prioritárias no momento.

Para todos esses encaminhamentos e cuidados, a coordenação procura estar, junto com a professora regente, sempre muito próxima também aos alunos, observando-os em diferentes momentos do seu dia a dia escolar, acompanhando sua produção, através de materiais que observa e discute com os professores regentes, com quem se encontra semanalmente, e também conversando com eles individualmente ou em grupo, sempre que necessário. Da mesma forma precisa acompanhar o trabalho do Grupo de Apoio, reunindo-se e orientando a professora responsável por ele. Assim, além de poder planejar com os professores novas formas de abordagem necessárias a determinado aluno ou grupo, pode intermediar, quando for preciso e oportuno, a relação com as famílias, reunindo-se com pais e especialistas dos alunos, sempre que necessário.

Por outro lado, o coletivo também é um foco de trabalho da escola, que procura garantir aos alunos a formação de posturas cooperativas e de compromisso com o grupo, através de um trabalho sistemático na área da SOCIALIZAÇÃO E FORMAÇÃO DO ESTUDANTE, que inclui temas como cooperação, autonomia, convivência respeitosa, espírito de equipe, valorização das diferenças, solidariedade e amizade, funcionamento e objetivos da escola, diferença entre público e privado, interação dos alunos com os trabalhos realizados nas diversas áreas do conhecimento e avaliações, e que promove atividades como a construção de regras, a discussão de dilemas e situações de conflito, os estabelecimentos de metas e as avaliações periódicas, as brincadeiras e jogos de integração, entre outras. Acreditamos que esse tipo de proposta nos permite ouvir mais ou alunos e nos aproxima mais deles e da sua forma de pensar, nos ajudando a obter um maior comprometimento de cada um e da turma em relação à aprendizagem e ao próprio grupo.

O trabalho que realizamos em relação aos cuidados com os ambientes e materiais da escola, frequentados e usados por todos, é um exemplo importante nesse sentido. Tanto no uso dos banheiros, como da biblioteca, do pátio, da sala de artes e outros, os alunos são sempre convocados a se dar conta de como está o ambiente, no momento em que chegam a ele, a refletir sobre como será bom que os colegas da turma seguinte o recebam e a atuarem no sentido de o deixarem da melhor maneira para eles. Procuramos acompanhar de perto essa questão, já que, para nós, este é um conteúdo de trabalho, tão importante como os conteúdos de matemática e leitura. Assim, ensinamos os alunos, por exemplo, a usar a descarga, a colocar os papéis no cesto, a organizarem livros nas estantes, sem amassá-los etc., explicamos as razões dessas atitudes, discutimos e analisamos as vantagens e desvantagens de diferentes posturas, fazendo registros e levando-os a se posicionarem e se comprometerem com o bem-estar de todos, incluindo eles próprios, bem como buscamos sistematizar essas posturas, lembrando-as, cobrando-as, estimulando-as o tempo todo.

As ASSEMBLEIAS DE TURMA são uma outra forma de realizar esse trabalho. São encontros semanais ou quinzenais de discussão e conversa entre os alunos, realizados na sala de aula, com a profª regente (eventualmente poderá haver algum outro convidado: profº especializado, coordenação, pai ou mãe da turma etc.), mas gradativamente coordenados pelos próprios alunos, que vão assumindo diferentes papéis, previamente estipulados a cada assembleia. Assim, há o coordenador geral, que vai colocando os assuntos em pauta (assuntos estes previamente sugeridos pelos alunos e professora), dando a palavra, retomando as formulações da turma (claro que sempre auxiliado pela profª), o que faz as inscrições de quem quer falar, o que controla o tempo de fala de cada um, o que faz a ata (registros), o que vai fazendo anotações no quadro para todos poderem acompanhar etc. À medida que o trabalho vai sendo realizado, diferentes funções podem surgir como necessárias e ser, então, instituídas. Esses papéis são exercidos, cada vez mais pelos próprios alunos, de modo que a profª vai auxiliando e ensinando, dando sugestões e intervindo sobre como se faz, garantindo que os momentos sejam produtivos e que todos tenham possibilidade de se colocar e ser ouvidos. Nesse sentido, esses papéis também podem ser exercidos por duplas de alunos, que se ajudam numa mesma tarefa. A profª é a única que não precisa se inscrever para falar, de modo a poder exercer esse papel de auxílio e orientação. A duração é de 30min a 1h, conforme a pauta decidida coletivamente no início da sessão.

Através desse trabalho, se sistematiza e institucionaliza as “rodas de conversa”, ampliando as oportunidades de aprendizado sobre a convivência em grupo. São feitas análises e reflexões em conjunto sobre situações vividas pela turma, planejamentos, combinações, retomadas etc., de modo a se garantir um espaço em que os alunos possam falar sobre a convivência cotidiana, os conflitos, o que está bem e o que não está, o que precisa melhorar ou ser diferente.

O GRÊMIO ESTUDANTIL, com o apoio da coordenação, também viabiliza um trabalho que estimula a iniciativa e a cooperação entre os alunos, na realização de projetos ou atividades que revertam em benefícios para todos. A diretoria, composta de alunos do 5º ano, é eleita trimestralmente (para que mais alunos tenham a chance de passar por essa experiência), formando-se, a partir daí, um conselho consultivo (1 representante eleito de cada turma do ensino fundamental), que se reúne e encaminha com a diretoria do grêmio e a orientadora sugestões e questionamentos dos alunos, tendo em vista o melhor funcionamento da escola e a promoção de atividades especiais aos alunos.

Destacamos, ainda, a atenção especial dada à formação e funcionamento dos grupos de trabalho na sala (grupos áulicos, eleitos periodicamente pelas próprias crianças, sob a coordenação da professora), conforme destacado anteriormente, à coletividade da turma e da escola, através de eventos conjuntos de integração e troca de conhecimentos (sábados culturais, uma vez por mês, seminários de apresentação de trabalhos entre as turmas, mostras e exposições, encontros com especialistas e convidados, eventos ou festas em função de uma determinada data comemorativa, rodas de história, mostra de teatro etc.), bem como a um trabalho constante de construção de regras e do respeito a elas, procurando garantir uma convivência cooperativa.

LEITURAS INDICADAS SOBRE O TEMA:
Projeto – Revista de Educação nº 11 – VIDA EM GRUPO